27.12.08

Demolição



Não há como dizer em meia-palavra. E nem meio som, meio sono, meia alegria, meio sonho. Era noite recém-nascida, meia-luz. Era uma vereda, uma picada, atalho. Pra morte. Qualquer um, sã consciência, o saberia. Nem quis saber, que consciência sã não tinha, e foi, corredor polonês, olhos de lince correndo a passagem, cobras e lagartos preparando o bote. Passou. Sem remo. Lenitivo a tiracolo, passo aprumado, ligeiro, o comprido do bar até a mesa, o povo de sempre, o socorro, acolhida. Tirou o adivinhão do bolso, banco de alvenaria, pernas balançando, nada à vontade.
Um, dois goles, um, dois copos, na entrada. À porta, olhos fixos, nada, ninguém, tanta, tanta gente. Bêbados, bêbadas, rapazes, moças, alegres. Uma, duas garrafas. Um aviso, distância sem fim até o balcão. O balcão do bar, o olhar, sorriso, risos iluminando a noite, luzes ofuscando em torno, tudo o mais sumindo, fugindo, passo da eternidade, portal do paraíso, divina comédia, inversão do percurso. Tanta, tanta luz naquela noite longe, naquele bar, olho no olho, riso no riso, dedos e panos, tanta promessa, tanta ventura, tanta alegria, tão pouco tempo e mais ninguém, mais nada, nem mais sons fora, círculo invisível, halo fosforescente, invólucro, crisálida, metamorfose.

Encanto.

Hiato.

A estrada nunca tem fim.
Uma lágrima e uma lembrança.

Inda ontem passou por lá. Na calçada, uns tijolos de demolição.
Nem mesmo o bar existe mais.

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