27.4.09

Estações




Entre as paredes de silêncio, mofo, lesmas, chuva. E o sopro da vertigem. E a imagem. E o medo.
No recinto, nada. A parede é branca, a parede é fria, a parede é amarela, a parede ignora, a parede não responde.
As paredes têm ouvidos, de mercador. As paredes têm línguas que ferem o mármore, lápide dos vivos.
Das paredes brotam garras que arranham os espelhos onde escrevem a elegia dos mortos.

Fora, os pingos nas pedras do chão. As gotas de lua nova encharcando a escuridão dos morcegos, as veredas do louva-a-Deus, a clareira onde pousa, verde, quieto, mãos postas, gravetos em oração.

Onde moro fica assim quando inverna em mim.

E é só uma pequena casa entre outras pequenas casas.
E é só um tempo e um lugar, perdidos, em idas e vindas sem fim.

E é templo.
E é abrigo.
E é palácio, do ouro da luz e da canção.
Sem torres, sem fossos, sem gaiolas, sem rouxinóis.

E é jardim. Horta. Pomar.
Então planto sonhos na soleira da porta, no meio das açucenas, debaixo do cajueiro-bravo, na sacada, entre samambaias.

Então planto sonhos nos rosais, com as pontas dos dez dedos verdes, como na Miraflores de Maurice Druon.

Então planto sonhos na cumeeira, no terraço, no oitão.

Para que nasçam nuvens.
Para que brotem estrelas.

Para que primavere em mim.

4 comentários:

joao batista disse...

Bonito demais!

MgP disse...

João, vindo de você é uma honra. Obrigada. Um beijo, ;)

Mme. S. disse...

O joão tem toda razão, m. tá lindo! deixa a gente sem palavras. cheiro.

MgP disse...

e a mim, encabulada... :)
outro.