Subi a ladeira, na costa, ondas despedaçando espumas, depositando, revolvendo na orla sedimentos, partículas de arrecifes, enchendo o ar de respingos, sal, maresia, tarde morta, balão amarelo, plenilúnio de fim de verão, rádio tocando 'a vida é bela, o mundo apodrece'.
Valsa de um tempo sujo, o mundo apodrece calcando poeiras revirando almas, sebosas, penadas, perdidas.
Subi a ladeira brisa molhada no rosto e não me resguardo, não me refaço, não me regenero, não me alimento, não regurgito, não perdôo.
Não perdôo os poucos amigos, não esqueci os poucos inimigos, não li o jornal, não sei do estupro, do apedrejamento, da excomunhão, do Mereto, dos bordéis da rua Augusta, nem canção nem plenilúnio, não me abstenho nem compareço.
Subi a ladeira, tardei, morri, fugi, não me chame, não pretendo ir.
Só daqui vejo a lua cheia, a noite nova, a vida breve, a onda forte, a pressa calma, só aqui não entendo nem preciso entender.
"Saí do palco, fui pra platéia.
Saí do pátio, fui pro porão."
(Sérgio Sampaio - Cabine 103)
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário